As primeiras tintas negras: O Homem De Côr na História do
Brasil
The first black colors: The Man Of Color in Brazilian History
CAHAPUZ, Pedro Domingos B.*
https://orcid.org/0009-0005-5190-5031
RESUMO: O presente trabalho tem como
principal objeto o primeiro jornal da chamada
“Imprensa Negra” brasileira: O Homem de Côr.
Temos por objetivo principal identificar a quem
o jornal se dirigia, via leitura dos números e
seguindo as orientações da literatura
historiográfica a respeito dos diálogos entre a
imprensa de cada época. A partir disso, foi
possível verificar o esforço do jornal em se dirigir
diretamente para a população afro-brasileira,
especialmente a da sede imperial. Publicado no
ano de 1833, marcou o surgimento de jornais
comprometidos em denunciar desigualdades e
discriminações raciais no Brasil. De forma breve,
também é apresentada a Imprensa Negra do
século XIX, e a Imprensa Abolicionista,
destacando as diferenças entre ambas.
PALAVRAS-CHAVE: Imprensa Negra; Imprensa
no Brasil Império; História e Imprensa;
Intelectualidade Negra.
ABSTRACT: This paper aims to analyze the
pioneering newspaper of the so called Brazilian
“Black Press”: O Homem de Cor. We have as our
main research objective identifying the paper’s
target audience toward the orientations from
the history field of studies on the need to think
about the multiple exchanges between the
different journals of each context. We were able
to discover that O Homem de Cor followed a
strong attempt to communicate directly with the
black Brazilian population specially the one living
in the Empire’s capital. A newspaper from Rio de
Janeiro, published in 1833, it marked the birth of
newspapers who had the common goal of
denouncing racial inequalities and
discriminations in Brazil. Brazilian Black and
Abolitionist Presses are briefly introduced,
highlighting the differences between them.
KEYWORDS: Black Press; Press in Imperial Brazil;
History and Press; Black Intelligentsia.
Recebido em: 13/04/2023
Aprovado em: 02/06/2023
* Graduado pelo PPGH/UFF, especialista em Política e Sociedade pelo IESP/UERJ, mestrando em História pelo
PPGH/UFF. E-mail: pedrodomingos@id.uff.br
Este é um artigo de acesso livre distribuído sob licença dos termos da Creative Commons Attribution License.
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Introdução
No presente trabalho busca-se apresentar a história do jornal O Homem de Côr,
destacando seu conteúdo de denúncia das discriminações raciais no Brasil de 1833. A
história do periódico confunde-se com a de parte da vida de Francisco de Paula Brito,
homem negro letrado e principal dono da tipografia onde se imprimia o jornal, sendo
discutido no artigo como este reagia frente ao contexto sócio racial amplamente injusto e
desfavorável no qual estava inserido no século XIX.
Nos pautamos especialmente pelas sugestões de três historiadoras (Capelato, 1988;
Cruz; Peixoto, 2007) a respeito do tratamento das fontes de imprensa, nos orientando pela
necessidade de inserir o jornal estudado dentro do contexto da imprensa da época, além de
buscar responder quando, como e para quê o jornal foi produzido, acrescentando de nossa
parte a pergunta “para quem”. Nos guiamos principalmente pela hipótese de ser possível
constatar, através da leitura do jornal, esforços de articulação política para a confrontação
às práticas de discriminação racial: se parte da ideia de que a denúncia dessas práticas era
tanto sintoma de uma tomada de consciência das condições desfavoráveis às quais a
população afro-brasileira estava submetida como forma de conclamação à organização por
parte dessa própria população.
Imprensa Negra no Século XIX e Imprensa Abolicionista
A chamada “Imprensa Negra” brasileira tem seus primórdios no século XIX, com o
pioneiro jornal carioca O Homem de Côr, de 1833, inaugurando toda uma gama de
periódicos que surgiram em diversas regiões do Brasil oitocentista. A historiadora Ana Flávia
Magalhães Pinto, em sua dissertação de mestrado, localizou e analisou oito periódicos que
poderiam ser considerados pertencentes à Imprensa Negra no século XIX: esta é descrita
pela mesma autora como correspondente “aos jornais que se inserem na luta contra a
discriminação racial no Brasil” (Pinto, 2006, p. 28). Essa definição, é importante mencionar,
demarca uma diferença fundamental entre Imprensa Negra e Imprensa Abolicionista, pois
esta última não necessariamente combatia o racismo per si, as discriminações que a
população negra nacional sofria cotidianamente: a linha de atuação da Imprensa
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Abolicionista, como está explícito no título, se concentrava na questão da abolição, o que
proporcionava presença de autores de diversos perfis, e propostas. Ponto de contato entre
todos os periódicos da chamada Imprensa Negra é também a autoria dos textos: é bastante
comum encontrar nos jornais dizeres de reivindicação e pertencimento racial, com os
autores enfatizando suas origens afro-brasileiras.
As duas questões, da abolição e do combate ao racismo, não necessariamente
estavam conectadas nas posições dos jornais dessas duas imprensas, e havia mesmo
periódicos da Imprensa Negra que não tocaram no assunto da abolição. Os oito jornais
destacados pela historiadora Ana Flávia são os seguintes: o citado Homem de Côr, do Rio
de Janeiro, surgido em 1833; Brasileiro Pardo, Rio de Janeiro, 1833; O Cabrito, Rio de
Janeiro, 1833; O Lafuente, Rio de Janeiro, 1833; O Homem: Realidade Constitucional ou
Dissolução Social, surgido no Recife, em 1876; A Pátria Orgam dos Homens de Côr, de São
Paulo, surgido em 1889; O Exemplo, de Porto Alegre, 1892; e O Progresso Orgam dos
Homens de Côr, de São Paulo, surgido em 1899. São, portanto, oito títulos, sendo que quatro
destes surgiram no mesmo ano, na mesma cidade, e os outros quatro são de cidades e
épocas distintas. Devemos ressaltar também a criação de novos jornais da Imprensa Negra
após a abolição da escravidão, indicando que a luta contra o racismo continuou a ser
necessária mesmo após a promulgação da Lei Áurea.
A historiadora Maria Helena Rolim Capelato considera haver três perguntas
fundamentais para análise de um periódico: “quem produziu o jornal? para que? quando e
como?” (Capelato, 1988, p. 24). Se nos orientarmos por essas três perguntas, observaremos
grandes diferenças entre as Imprensas Abolicionista e a Negra oitocentistas. Como citado,
o objetivo principal da Imprensa Negra era combater o racismo, o que geralmente se
realizava através de denúncias de casos de discriminação nesses jornais. a Imprensa
Abolicionista objetivava discutir e divulgar a questão da abolição, não se atrelando à questão
racial. Sobre a questão da autoria, e podemos acrescentar também, do público-alvo,
também havia grandes diferenças:
De perspectiva bem diversa da posta em uso pelo periódico negro, a imprensa
abolicionista brasileira, de modo geral, foi uma manifestação da elite branca de
origem escravista acerca de seus impasses particulares no fim do século XIX. Sua
pretensão de convencimento não se voltava a um público de livres e libertos
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descendentes de africanos, mas aos fazendeiros e escravocratas quase sempre
convictos de seu poder (Pinto, 2006, p. 118)
1
.
Sendo O Homem de Côr o jornal que abre a lista da Imprensa Negra do Oitocentos,
podemos admitir que a Imprensa Abolicionista tem surgimento bastante posterior, tendo a
maioria de seus periódicos inaugurados apenas na década de 1870, que é justamente a
década de aparição do que podemos chamar de “segunda fase” da Imprensa Negra,
descolada dos periódicos de 1833, e que começa com a publicação do pernambucano O
Homem em 1876.
Sobre o contexto de produção dos jornais da Imprensa Negra, Petrônio Domingues
diz o seguinte:
[...] se as associações negras constituíam uma das principais fontes de recursos
para a publicação dos jornais, estes também eram mantidos com o dinheiro
proveniente dos assinantes, dos modestos anúncios publicitários e da promoção de
festas, rifas e leilões beneficentes. As tipografias que imprimiam os periódicos
eram por vezes improvisadas, instaladas em condições precárias, até mesmo na
casa dos editores. A qualidade gráfica, a diagramação e a revisão evidenciam essa
produção artesanal (Domingues, 2018, p. 257).
As condições descritas pelo historiador nos ajudam a compreender melhor, por
exemplo, as causas que ocasionaram o curto tempo de existência de todos os periódicos da
Imprensa Negra oitocentista. Como muitos desses periódicos eram provenientes de
iniciativas pessoais, muitas vezes de indivíduos sem grandes posses, as dificuldades materiais
poderiam rapidamente impossibilitar a produção dos jornais. Sobre o perfil dos autores, o
mesmo Domingues ressalta a esmagadora predominância masculina, destacando que “até
meados do século XX, as mulheres não chegavam a 10% do total de colaboradores”
(Domingues, 2018, p. 257).
A possibilidade de se findar a escravidão no Brasil era bastante remota nos anos pré-
1850, e tênue mesmo após a promulgação da lei deste mesmo ano, que pôs fim ao tráfico
internacional de africanos. Rebeliões escravistas, fugas de escravos, movimentos por
liberdade haviam ocorrido em bom número, porém a discussão legal pelo fim da
escravidão se inicia de forma contundente a partir dos anos 1870, década na qual
1
A grafia das palavras foi atualizada. Contudo, mantenho as letras maiúsculas e a pontuação original.
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começam a surgir movimentos abolicionistas mais organizados e a própria Imprensa
Abolicionista. Humberto Fernandes Machado afirma que
[...] foram fatores favoráveis para o desenvolvimento do abolicionismo: o término
da escravidão nos Estados Unidos, as manifestações externas contrárias à
instituição, como, por exemplo, o apelo da Junta Francesa de Emancipação, em
1866, ao Imperador, e o fim da Guerra do Paraguai, com a participação de cativos,
reforçando a atuação dos opositores ao escravismo (Machado, 2014, p. 114).
O que fica evidenciado é que na década de 1870 a instituição escravista nas Américas
de modo geral estava em franco declínio. Esse contexto gerou as possibilidades para o
surgimento de movimentos abolicionistas que atuavam na esfera pública pela via legal,
criticando e pressionando parlamentares e o próprio monarca, cobrando-os de resoluções
para o chamado “problema servil”. É vital compreendermos esse ponto, pois ele está
diretamente relacionado à atuação da Imprensa Abolicionista: a luta desta era realizada
através de denúncias nos jornais da situação dos escravizados, das injustiças para com estes,
que inclusive tinham base jurídica.
A lei Eusébio de Queiroz, de 1850, pusera fim ao tráfico internacional de africanos no
Brasil. Entretanto, essa lei ignorava a sua predecessora, de 1831, e não previa punição aos
senhores de escravos que haviam importado, ilegalmente, africanos entre 1831 e 1850: em
suma, era como se o tráfico de escravizados realizado dentro desse período tivesse sido
“legal”, ignorando a vigência da lei de 1831. É dentro desse paradoxo, gerado pelo combate
legal com atraso de 19 anos ao tráfico de escravos, que se sustentariam as primeiras
argumentações dos abolicionistas.
[...] a partir de meados da década de 1860, a estratégia abolicionista adotada por
advogados como Luís Gama foi a de levar ações de liberdade aos tribunais.
Argumentava-se que, se a lei de 1831 nunca deixou de estar em vigor, todos os
africanos que ingressaram no país após essa data deveriam ser imediatamente
libertados, bem como seus descendentes [...] esse tipo de alternativa radical do
abolicionismo se contrapunha à estratégia gradualista que se desenhava nos
debates no Conselho de Estado e depois no Parlamento (Grinberg; Mamigonian,
2018a, p. 290).
Em particular, destacamos na Imprensa Abolicionista três jornais: O Abolicionista
(1880-81); a Gazeta da Tarde (1881-88); e a Cidade do Rio (1887-1889). Os três periódicos
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cariocas pertenciam a José do Patrocínio, homem negro cuja mãe era ex-escrava. A atuação
de José do Patrocínio é exceção à linha de raciocínio que considera o abolicionismo como
proveniente de uma elite branca nacional, como afirma Ana Flávia, embora deva-se ressaltar
que os três periódicos citados, pertencentes a José do Patrocínio, não estampavam anúncios
de vendas de escravos, uma das contradições de boa parte da Imprensa Abolicionista.
Consideramos como principal ambiguidade do abolicionismo no Brasil, que permeava
a maioria dos periódicos da Imprensa Abolicionista e do próprio movimento em si a
seguinte: ao mesmo tempo que se fazia campanha pela libertação dos escravos, trabalhava-
se para impedir uma possível vingança destes, na pior das hipóteses, e mesmo para que os
ex-escravizados pudessem adquirir direitos e garantias que eram restritos à minoria da
população brasileira, e que desta forma se configuravam como privilégios. Essa contradição
recaía inclusive sobre alguns abolicionistas considerados mais radicais: analisando
especificamente a atuação de José do Patrocínio na Imprensa Abolicionista, o historiador
Humberto Fernandes Machado comenta que
A cautela de Patrocínio se vinculava a uma hipotética revolta de escravos, que
poderia descambar para uma convulsão social. Assim, esses intérpretes dos cativos
endossavam, indiretamente, as preocupações dos senhores na medida em que
deixavam transparecer uma apreensão com possíveis agitações. De um lado,
apresentavam aos senhores as consequências nefastas para o país decorrentes da
escravidão. Por outro, buscavam tranquilizá-los de que as suas ações tinham como
objetivo o controle sobre a massa de escravos. Afinal, as fugas, revoltas,
assassinatos de fazendeiros e feitores intensificavam-se (Machado, 2007, p. 6).
Dessa forma, a Imprensa Abolicionista, calcada nos ideais de progresso e civilização,
atuava pela libertação dos escravizados, porém se encontrava num impasse. Assumir uma
posição de franco-atirador, clamando por rebeliões de escravizados, poderia ter efeito
explosivo, e sobretudo, sangrento, culminando com um estado de caos. Patrocínio, um dos
mais eloquentes, chegava a criticar D. Pedro II com frequência, pois o enxergava como o
único capaz de sepultar a escravidão. Dessa forma, o público-alvo da Imprensa Abolicionista
era, de modo geral, o de escravocratas e/ou de parlamentares, pessoas ligadas à Corte de
algum modo. Como Machado comenta, “o seu objetivo era buscar sensibilizar o aparelho de
Estado” (Machado, 2014, p. 149) e os responsáveis principais pela manutenção da
escravidão.
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O movimento abolicionista, e a atuação da imprensa neste se intensificaram na
década de 1880, com os jornais funcionando como meio de veiculação das ideias (Machado,
2007, p. 1). É sempre essencial recordar que nessa época as taxas de analfabetismo eram
altíssimas, porém a mensagem dos periódicos era muitas vezes relatada oralmente aos
analfabetos pelo público leitor, como comentam Ana Luiza Martins e Tânia Regina de Luca:
“as práticas de leitura em alta voz e coletivas eram constantes nos antigos regimes [...] a
leitura da imprensa periódica, em seus primeiros tempos, era ainda marcada por essa
oralização coletiva” (Luca; Martins, 2008, p. 28).
Ao tecermos os comentários que ressaltam o caráter antipopular da Imprensa
Abolicionista, não procuramos destacar uma suposta popularidade da Imprensa Negra que
estudamos. Sobre a situação da divulgação e da popularidade da imprensa na história do
Brasil, Nelson Werneck Sodré diz que
[...] é preciso, desde logo, compreender e aceitar que a imprensa não é meio de
massa, em nosso país. Como, aqui, por imprensa entende-se jornal e revista, é fácil
constatar que esses meios não são de uso habitual em parcela numerosa,
majoritária mesmo, do nosso povo (Sodré, 1999, p. IX).
Foi justamente o Rio de Janeiro uma das províncias que a Imprensa Abolicionista teve
atuação mais presente e influente. Destacamos que os periódicos nos anos 1870-80 eram
vendidos especialmente por ambulantes, mas também em quiosques, juntamente com livros
e cigarros, além de ser possível também realizar assinatura para adquiri-los.
Em linhas gerais, podemos resumir o direcionamento dos dois tipos de imprensa aqui
citados. Se a propaganda abolicionista tinha como principal alvo os proprietários de
escravos, especialmente os grandes proprietários, O Homem de Côr em momento algum
deixa explícito a qual público estão se dirigindo. Pode-se argumentar que o público-alvo era
o negro letrado, porém, as denúncias de discriminação noticiadas estavam se referindo
muitas vezes a ações de preconceito que partiam de não-negros. podemos conjecturar,
mas como não editorial aberto de luta direta ao racismo, como por exemplo incitação às
revoltas armadas e formação de associações negras, podemos pensar que os periódicos se
direcionavam aos dois públicos: o negro e o branco. Dessa forma, adicionamos uma quarta
pergunta às três elencadas por Maria Helena Capelato: “para quem o jornal escrevia?”.
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Análise do jornal O Homem de Côr
O Homem de Côr, jornal fluminense, publicou cinco números, com periodicidade
irregular, tendo curtíssima duração o que aliás é característica de toda a Imprensa Negra
oitocentista, e de modo geral, à própria imprensa brasileira da época não conseguindo ir
além de seu ano de publicação, 1833. Antes de tratarmos do jornal, é necessário apresentar
Francisco de Paula Brito, homem negro nascido em 1809, que ficou célebre como editor e
tipógrafo principalmente. Sua vida nos interessa porque a história d’O Homem de Côr faz
parte da história de Paula Brito. Seu biógrafo, o historiador Rodrigo Camargo de Godoi, diz
que ele era possivelmente o caçula dos filhos de Maria Joaquina da Conceição e do
carpinteiro Jacinto Antunes Duarte.
Aos 13 anos, Paula Brito foi morar com o avô, tornando-se aprendiz de tipógrafo da
Tipografia Imperial e Nacional em 1824. Godoi comenta que “quando ingressou na
Tipografia Nacional, Paula Brito devia ter um conhecimento bastante satisfatório da
gramática da língua portuguesa, na medida em que esse era o requisito fundamental a
aspirantes a tipógrafo” (Godoi, 2016, p. 57). Com apenas 15 anos, portanto, Paula Brito
dominava a leitura e a escrita, algo muito raro no Brasil oitocentista. Somado a isso, ele
trabalhou posteriormente em duas tipografias cujos donos eram franceses, que lhe
ensinaram não apenas o idioma como também aspectos da cultura francesa. Não é risco
algum dizer que pouquíssimos no Brasil da década de 1820 tinham acesso a esses saberes;
considerando ainda a ascendência de Paula Brito, seu caso se tornava mais raro.
Ele trabalhou na tipografia de Plancher, um dos tipógrafos franceses, de 1827 a 1830,
e, sendo liberal exaltado, participou em 1831 de modo ativo da manifestação de 6 de abril
no Campo de Santana, que culminou com a abdicação de D. Pedro I e com a formação da
Regência Trina. Em 1830, a vida de Paula Brito começara a se modificar bastante, com a
morte de seu avô, que lhe forçou a ir morar na casa do primo Silvino, que vendeu sua livraria
para o próprio Paula Brito em 1831. É importante pensarmos que o conceito de livraria era
bastante diferente na época: lá se vendiam jornais, sim, mas também sabonetes, chás, entre
outros produtos. Na livraria de Paula Brito eram vendidos quatro jornais, todos de
orientação política exaltada: O Ipiranga, O Simplício da Roça, Sentinela da Liberdade e O
Regente. Godoi diz o seguinte:
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[...] por um lado, esse dado reflete o posicionamento político de Paula Brito, que
mesmo antes de pensar em ser livreiro já desfilava com o chapéu de palha exaltado
pelas ruas do Rio de Janeiro. Por outro lado, o fato também pode estar ligado à
considerável produção de jornais desse grupo político entre 1829 e 1834. Em
termos quantitativos, os exaltados superaram os caramurus e os moderados em
periódicos, publicações que se compunham em grande parte de pasquins de
pequeno formato e curta periodicidade (Godoi, 2016, p. 85).
Paula Brito conseguiu fundar a própria tipografia em 1832, entre os dias 4 e 11 de
setembro. O nome do estabelecimento era Tipografia Fluminense de Brito e Companhia, o
que indica sociedade. Sobre a produção de jornais no Rio de Janeiro, é importante ter noção
do volume de periódicos, bastante alto em relação a outras províncias do Império. Se
tomarmos São Paulo como parâmetro de comparação, foi só em 1827 que se fundou a
primeira tipografia na cidade e o primeiro jornal impresso, o Farol Paulistano, por José da
Costa Carvalho. No mesmo ano, “na Corte existiam cinco tipografias e circulavam doze
periódicos. No entanto, em 1828, São Paulo passou a sediar a Faculdade de Direito,
consequentemente tornando-se um importante mercado para os livros e impressos” (Godoi,
2016, p. 74-75).
Dessa forma, a cidade do Rio de Janeiro era efervescente em matéria de produção de
jornais, sendo que a orientação política destes se refletia nas principais correntes da época.
José Murilo de Carvalho destaca dois grupos principais:
[...] na capital, liberais moderados, absolutistas, chamados de caramurus, e
radicais, conhecidos como exaltados, organizados em sociedades à moda da
maçonaria, disputavam o poder nas ruas, na imprensa e no Parlamento. Os
moderados, no controle do governo, tiveram de enfrentar dois grandes problemas,
o da manutenção da ordem pública e o das pressões federalistas (Carvalho, 2012,
p. 89).
Se na livraria de Paula Brito se vendiam jornais exaltados, alinhados com sua
própria posição política, na Tipografia Fluminense de Brito e Companhia a situação mudou
bastante. Godoi listou onze jornais que foram impressos no estabelecimento, de 1832 a
1833, sendo sete destes exaltados, dois restauradores, um moderado, e outro de
“conciliação”. Como comentado pelo próprio historiador, os custos de impressão na época
eram muito altos, e sendo este o principal meio de lucro do negócio de Paula Brito, fazia-se
necessário vender jornais que talvez não agradassem tanto o editor. Ademais, o impressor
havia casado recentemente, e a pressão por ter renda aumentara.
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O Homem de r ou O Mulato teve seu primeiro número vendido no dia 14 de
setembro de 1833, um ano após a abertura da tipografia. grande discussão na
historiografia acerca da autoria dos números do jornal, sendo o próprio Paula Brito um dos
“suspeitos” principais. Seu biógrafo enumerou dois estudiosos que chegaram à diferentes
conclusões a respeito desse ponto: Célia Azevedo acredita ter sido sim Paula Brito o redator
do jornal, enquanto Thomas Flory não se arrisca a cravar quem seria o autor. É vital
lembrar que no jornalismo oitocentista havia o anonimato sobre os autores de cada jornal,
sendo apenas os impressores as figuras públicas. Dessa forma, de modo geral mais
conjecturas do que certezas em relação a autoria dos jornais do período.
Godoi comenta que
O único laço empírico que se pode estabelecer com segurança entre O Mulato ou
Homem de Côr e Francisco de Paula Brito é que esse periódico foi impresso na
Tipografia Fluminense de Brito e Companhia. Porém, ao observá-lo de perto, temos
que seu redator anônimo procurava mostrar que as perseguições aos pardos se
efetivavam, entre outras formas, por meio da exclusão desses cidadãos dos cargos
públicos. [...] Daí a necessidade de se ler esses jornais inseridos no contexto político
iniciado após o Sete de Abril, buscando desvendar sua gramática em meio aos
embates entre moderados, exaltados e caramurus. O que emerge dessa imprensa,
por conseguinte, longe de uma recusa da raça é a articulação política da mesma
(Godoi, 2016, p. 90).
Dessa forma, a autoria d’O Homem de Côr é questão aberta. O que mais chama a
atenção é que a escrita do periódico chama para si a condição de escrita negra, muitas vezes
utilizando a condição de “homem de cor” no coletivo. Dessa forma, é possível afirmar que o
jornal foi escrito por um ou mais homens negros.
Paula Brito foi homem negro, exaltado e letrado, envolvido diretamente com a
produção de jornais justamente num período que começa a surgir o que Keila Grinberg
chama de “politização da cor”:
[...] uma das principais marcas das duas décadas posteriores à independência do
Brasil foi a politização da cor. Por todo o império, crescendo nos anos 1830,
pipocavam revoltas e manifestações além de jornais como O Brasileiro Pardo e O
Homem de Côr que traziam as reivindicações dos chamados ‘cidadãos de cor’ de
serem incorporados, de alguma maneira, à nação e ao Estado que então se
formavam. Afinal, embora formalmente a Constituição de 1824 reconhecesse como
iguais, atribuindo direitos de cidadania, todos os homens livres, incluídos os
libertos, na prática os cidadãos descendentes de escravos reclamavam por ser
considerados cidadãos de segunda categoria, inaugurando, na linguagem política
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brasileira, o que hoje poderia ser chamado de ‘luta contra a discriminação racial’
(Grinberg, 2018b, p. 271).
É exatamente essa luta que está presente no Homem de Côr, e, mesmo sendo Paula
Brito autor ou não, é inegável que forneceu apoio à sua produção. A luta de ter os direitos
constitucionais respeitados, de não estar invisível e discriminado por braços do Estado
permanece. Tendo apresentado brevemente a história de Paula Brito até o ano de
publicação do Homem de Côr, entramos finalmente na análise do próprio jornal.
Imagem 1. Exemplo de cabeçalho do Homem de Côr
2
Fonte: Hemeroteca Digital, Biblioteca Nacional, 1833, p. 1.
A opção do (s) autor (es) foi de trazer de cara artigos da Constituição de 1824
cabeçalho este presente em todos os cinco números que primavam pela igualdade dos
cidadãos brasileiros, especialmente no ponto da admissão aos cargos públicos. Apoiar-se na
Constituição, reforçando as injustiças denunciadas nos jornais, dando ênfase ao seu caráter
anticonstitucional foi o principal método de crítica do periódico. Na última página do
primeiro número, lê-se o seguinte: “a Nação Brasileira marchará rapidamente a grandeza,
que a vastidão dos seus recursos lhe tem marcado, se o poder deixar de guiar-se por clubes
tenebrosos, abraçando-se com a Constituição” (Homem de Côr, 1833, p. 4). Fica evidente a
2
Segue a transcrição completa do conteúdo do cabeçalho: Const. Política do Império, Tít. 20. Dos Cidadãos
Brasileiros, art. . São Cidadãos Brasileiros &e. &e. §º 1.º 2.º 3.º 4.º e 5.º. Tit. 8º. Das disposições gerais, e
garantias dos direitos civis, e políticos dos Cidadãos Brasileiros art. 179 § 14. Todo o Cidadão pode ser admitido
aos cargos públicos civis, Políticos e Militares, sem outra diferença que não seja a de seus talentos e virtudes. O
Povo do Brasil é composto de Classes heterogêneas, e debalde as leis intentem misturá-las, ou confundi-la
sempre alguma há de procurar, e tender a separar-se das outras; e eis um motivo mais para a eleição recair nas
classes mais numerosas. Por Manuel Zeferino dos Santos, Presidente de Pernambuco. Ofício de 12 de junho de
1833.
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confiança do periódico no mecanismo constitucional de governabilidade, exaltando a Carta
de 1824. Sendo a Constituição da história brasileira, a população tinha pouco tempo de
experiência com esse modelo, o que ampliava as possibilidades de empolgação com este.
Esteticamente, podemos dizer que O Homem de Côr era um perfeito exemplo de seu
tempo, comparável por exemplo à Aurora Fluminense, jornal que durou muito mais tempo.
Até mesmo pelo contexto da imprensa na época, em que ressaltamos ser muito
dispendioso produzir jornais, não há imagens, charges, ou elementos do gênero na imprensa
carioca de 1833.
O projeto gráfico d’O Homem de Côr, ou seja, a “organização e distribuição de
conteúdo nas diversas partes e seções no interior do periódico” (Cruz; Peixoto, 2007, p. 265)
não apresenta divisão por seções recorrentes: quando seções dentro de um número,
valem apenas para aquele número determinado, não aparecendo nos próximos exemplares.
Logicamente, O Homem de Côr possui fio condutor e assuntos que aparecem em diversos de
seus cinco números de maneira coerente, entre eles as denúncias de discriminação racial, e
a propaganda política pró-exaltada e anti-moderada.
A periodicidade do jornal não se mostrou regular, possivelmente por dificuldades
financeiras. Dessa forma, entre a publicação dos números um e dois se transcorreram duas
semanas, entre os números dois e três dezoito dias, entre os números três e quatro apenas
uma semana, e finalmente entre os números quatro e cinco doze dias.
Tabela 1. Periodicidade do jornal O Homem de Côr
Data de
publicação de
cada número
de dias entre
a publicação
dos números
Número 1
14 de setembro,
1833
-
Número 2
28 de setembro,
1833
14 dias
Número 3
16 de outubro,
1833
18 dias
180
Faces da História, Assis/SP, v. 10, n. 2, p. 168-190, jul./dez., 2023
Número 4
23 de outubro,
1833
7 dias
Número 5
4 de novembro,
1833
12 dias
Fonte: autoria própria.
Dessa forma, mesclando o roteiro de análise proposto pelas historiadoras Heloísa de
Faria Cruz e Maria do Rosário da Cunha Peixoto com as reflexões de Maria Helena Capelato,
passamos à análise do conteúdo do periódico, sendo que a última nos fornece três
perguntas fundamentais. A primeira pergunta, “quem produziu o jornal?” é, como vimos,
tema ainda aberto a discussões; “quando e como?” é sabido: ano de 1833, na Tipografia
Fluminense de Brito e Companhia. A pergunta “para quê” é a mais interessante, e a que
responderemos ao longo do exame do periódico.
A abertura d’O Homem de Côr, de 14 de setembro de 1833, não traz pronunciamento
do autor acerca dos principais objetivos do periódico, ou alguma explicação sobre suas
motivações. O primeiro tópico abordado diz respeito às Guardas Nacionais, criadas em 1831,
compostas especialmente por proprietários, e com um corte censitário alto para
participação. A chamada “Milícia Cidadã” “copiou o espírito da instituição francesa do
mesmo nome, qual seja, colocar a manutenção da ordem nas mãos dos que tinham algo a
defender, isto é, dos proprietários” (Carvalho, 2012, p. 89). O Homem de Côr lamenta a
ineficiência das Guardas Nacionais em garantir a “defesa do Brasil e segurança da
tranquilidade interna” (O Homem de Côr, 1833, p. 1).
O segundo tópico levantado apresenta conteúdo diferente: dirige-se
nominalmente ao presidente da província de Pernambuco, Manoel Zeferino dos Santos,
questionando-o e alarmando a ele aos seus “asseclas” para
[...] não confundirem as classes, a diferença entre nós está na razão da ciência e da
virtude entre a estupidez e o vício: o título da Constituição marcando os
Cidadãos Brasileiros não distinguiu o roxo do amarelo o vermelho do preto, mas o
ditador Zeferino [...] Demos ao Presidente moderado que devera-se criar Batalhões
segundo os quilates da cor, criava-se um Batalhão dos intitulados brancos do Brasil,
outro de mulatos, e outro de pretos, O Comandante Geral seria branco (Homem de
Côr, 1833, p. 2).
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Faces da História, Assis/SP, v. 10, n. 2, p. 168-190, jul./dez., 2023
Chama a atenção o fato da denúncia “furar” a regionalidade, destacando caso da
província de Pernambuco, o que possivelmente foi feito pelo autor para chamar a atenção
da urgência do problema, que atravessava províncias brasileiras distantes, se configurando
dessa forma em questão nacional. De modo geral, a crítica d’O Homem de Côr recai sobre a
escolha dos oficiais, quase sempre brancos, excluindo os negros da nomeação aos cargos
mais altos. Esse tipo de denúncia exclusão de negros de cargos públicos por motivações
raciais é a que se faz mais frequente ao longo do jornal, com outros casos até mais
específicos e detalhados surgindo em outros números.
Pode-se afirmar que a agenda do Homem de Côr traz duas frentes principais, sendo a
primeira de defesa do grupo liberal exaltado, apresentando as insatisfações frente à política
imperial dos conservadores e dando destaque à perseguição política, e na segunda frente as
denúncias de discriminações raciais, trazendo desde casos locais até de outras províncias.
Exemplo que corrobora com a afirmação acima encontra-se no conteúdo do segundo
número, de 28 de setembro de 1833. Neste, denúncia breve de racismo: “os
Pernambucanos deportados sem as fórmulas garantidoras da Liberdade para Fernando
(talvez por haver muitos homens de cor)” (Homem de Côr, 1833, p. 2), que não se
desenvolve ao longo do jornal. Boa parte desse exemplar se concentra em realizar críticas
aos políticos “chimangos”, ou moderados, falando diretamente de personagens que
haviam sido citados no primeiro número, como Cônego Januário, Paulo Barboza, Duque de
Bragança, Barbacena, entre outros. Da mesma forma, se faz denúncia da perseguição
política sofrida pelos que participaram da manifestação do dia seis de abril, que culminou
com a abdicação de D. Pedro I: “O Major Pimentel [havia] perseguido o Major Cipriano
Comandando a Artilharia, sem que tivesse feito alguma coisa para o dia 6” (Homem de Côr,
1833, p. 2).
Característica que merece destaque é a não publicação de anúncios de venda de
escravos no jornal, algo muito comum à época, e que garantia dinheiro proveniente dos
anunciantes. Embora não haja nenhum comentário crítico à escravidão (e em 1833, a
abolição era fantasia no Brasil) não há também material de incentivo à esta, como os
anúncios faziam indiretamente. São vários os periódicos da época que traziam os anúncios
de escravizados; citando os cariocas: o Diário do Rio de Janeiro, o Correio Mercantil são
alguns dos que trazem páginas de vendas de cativos. O Jornal do Commercio tinha uma
seção específica para anúncios, que quase sempre traziam notícias de cativos fugidos, ou
182
Faces da História, Assis/SP, v. 10, n. 2, p. 168-190, jul./dez., 2023
a venda. Como ressalta Humberto Fernandes Machado, “o Jornal do Commercio notabilizou-
se pela linguagem moderada e conservadora que lhe granjeou grande prestígio entre as
elites do Império, confundindo a sua história com a própria história do Segundo Reinado”
(Machado, 2014, p. 129). Para se ter ideia de como os jornais dependiam dos anunciantes,
a Gazeta de Notícias, jornal abolicionista fundado em 1876, trazia anúncios de aluguel de
escravos, abrindo-se a fenda da contradição.
Houve duas matérias de fôlego no Homem de Côr, que atravessaram mais de apenas
um número, por vezes sendo comentada até em três: a do assassinato do “Sr. Clemente”,
redator do periódico Brasil Afflicto, e a da prisão do “Sr. Mauricio Jozé de Lafuente”,
considerada injusta pelo periódico. Outros casos de discriminação racial, de denúncias de
injustiças aparecem nos cinco números, porém não nenhum assunto tão detalhado e
discutido como os dois citados acima.
A primeira das matérias citadas que aparece é a do assassinato do “Sr. Clemente”, no
exemplar número dois dO Homem de Côr, que se inicia apenas em sua última página. O
redator traz a matéria sobre o assassinato, chamando Carlos Miguel de Lima de “assassino,
vil covarde, e caluniador” (Homem de Côr, 1833, p. 4), sendo este filho do general Francisco
de Lima e Silva, então um dos membros da regência Trina. A notícia do assassinato não era
nova n’O Homem de Côr: a chamada foi feita nas últimas linhas do primeiro número, porém
neste segundo exemplar surge com muito mais detalhes: é afirmado que Carlos Miguel
conseguiu escapar da punição pelo assassinato denunciado porque houve alteração dos
processos por ordem do assassino, que foi ajudado por três escrivães, sendo os nomes
destes publicados no jornal.
Não nenhum conteúdo de racismo citado pelo jornal no caso, mas sim de
impunidade e injustiça, no caso, cometida pelo filho de um dos Regentes. Dessa forma, O
Homem de Côr criticava abertamente uma figura pública poderosa, descrevendo inclusive os
mecanismos utilizados pelo criminoso para escapar da cadeia. Questão importante é qual o
grau de risco que O Homem de Côr assumia ao realizar tal denúncia. A tensão da atmosfera
política traria consequências diretas a Paula Brito que veremos mais tarde porém é
interessante questionar se o jornal teria algum pioneirismo ao divulgar a matéria.
O periódico Aurora Fluminense (1827-1839), um dos mais influentes do Rio de
Janeiro, pertencia a Evaristo da Veiga, homem de alta erudição, que inclusive conhecia
pessoalmente Paula Brito, sendo a poesia o que aproximara ambos em 1823. No dia 13 de
183
Faces da História, Assis/SP, v. 10, n. 2, p. 168-190, jul./dez., 2023
setembro de 1833, saiu a notícia da Aurora Fluminense a respeito do assassinato do “Sr.
Clemente”, que traz posição bastante diferente da d’O Homem de Côr:
[...] todos os esforços têm sido empregados, para fazer crer que o acontecimento,
ocorrido na tarde do dia 9 do corrente mês, tendo sido gravemente ferido
Clemente José d’Oliveira, responsável do Brasil Afflicto, pelo Alferes o Sr. Carlos
Miguel de Lima, é devido a causas políticas [...] Clemente José d’Oliveira caluniara
com a maior infâmia as irmãs do Sr. Carlos Miguel de Lima [...] o Sr. Carlos Miguel
de Lima, passando fardado pelo Largo do Carioca, viu [...] o homem que o
ofendera [...] descarregou-lhe uma cutilada sobre a cabeça. O ferido caiu logo em
terra, (o que, segundo contam, impediu o Sr. Lima de dar-lhe o segundo golpe) e foi
dali transferido ao Hospital donde depois o tiraram [...] então o agressor, saindo
sem ser molestado por pessoa alguma, foi entregar-se à prisão, a fim de sofrer a
pena que a Lei lhe destinar. Nós não podemos aprovar uma ação que as Leis
condenam; mas perguntamos a qualquer Pai, Esposo, ou Irmão o que faria, se
acerca do que lhe é mais caro, de pessoas de um sexo que não tem defesa, um
bandido, um insolente usasse da linguagem que usou em público, perante um Juiz,
o indivíduo que foi acutilado pelo Sr. Carlos Miguel de Lima?! (Aurora Fluminense,
1833, p. 2)
Não críticas ao assassino, nenhuma palavra do tipo “vil” a seu respeito. Ao
contrário, se defende explicitamente o filho do regente, quase que se lamentando que a Lei
punisse agressões tais quais a que ocorreu. A matéria da Aurora Fluminense foi publicada um
dia antes do lançamento d’ O Homem de Côr, com muito mais detalhes do que o noticiado
neste último. Sobre o ponto da ofensa no Brasil Afflicto, O Homem de Côr diz que são
mentirosas as afirmações de Carlos Miguel de Lima, taxando-o de vez de assassino. Todavia,
essas afirmações aparecem no n. 2 do jornal, portanto no dia 28 de setembro de 1833,
quinze dias após a notícia aparecer pela primeira vez na Aurora Fluminense. Tendo passado
mais dias, e com o caso mais bem apurado, o periódico de Evaristo da Veiga continuou
defendendo o filho do regente?
No dia 2 de outubro do mesmo ano, a Aurora Fluminense publica o seguinte:
[...] na Verdade de feira passada, leem-se três documentos que provam a
existência dos obscenos insultos, pronunciados em público juízo por Clemente José
d’Oliveira, contra a respeitável família do Regente o Sr. F. de Lima. se dão
também os motivos da confusão que houve acerca do depoimento verbal e do
10 do Brasil Afflicto [...] o fato das torpes e infames calúnias existia, e chegou ao
conhecimento do Sr. C. Miguel de Lima no mesmo dia em que este rompeu no
excesso de que todos estão informados [...] é debalde que os escritores
caramurus têm procurado macular a honra do Sr. Carlos Miguel de Lima (Aurora
Fluminense, 1833, p. 2-3).
184
Faces da História, Assis/SP, v. 10, n. 2, p. 168-190, jul./dez., 2023
Fica evidente qual ponto incomodou mais cada um dos jornais que trouxemos aqui:
n’O Homem de Côr, deu-se enfoque ao assassinato e a impunidade do filho do regente; na
Aurora Fluminense, o que mais chocou o editor foram as supostas ofensas publicadas por
Clemente José d’Oliveira. O assassinato em si nem mesmo é descrito como tal, sendo
utilizada a palavra “excesso”. Trouxemos esses dois contrapontos no esforço de responder à
questão formulada algumas páginas atrás: O Homem de Côr se arriscou ao noticiar o
assassinato em formato de denúncia? Ou essa foi a posição hegemônica da imprensa da
época? A Aurora Fluminense é jornal de muito mais recursos do que o que estamos
analisando, tanto que durou 12 anos. comentamos sobre sua influência Evaristo da
Veiga seria inclusive eleito deputado duas vezes por Minas Gerais portanto é razoável
supor que a posição desse jornal foi adotada por mais periódicos.
Citando alguns periódicos de menos fama do período, vemos que o carioca A
Verdade adotou posição de defesa a Carlos Miguel de Lima (Clemente é “malvado”, “imoral”
para o jornal), e quanto ao assassinato é afirmado que “não pretendemos louvar este fato,
porque é contrário às leis; mas se fatos de tal natureza podem em algum caso ter desculpa,
nenhum tem mais do que o do Sr. Carlos” (A Verdade, 1833, p. 2); porém podemos
encontrar também periódicos que denunciaram o assassinato do redator, incluindo O Grito
dos Opprimidos e A Baboza, dois jornais também impressos na Tipografia Fluminense de
Brito e Companhia. O Diário do Rio de Janeiro, que não possuía vínculo direto com Paula
Brito, adotou posição de crítica ao assassinato também.
Dessa forma, O Homem de Côr não estava isolado no conflito de narrativas em torno
do assassinato, porém é indiscutível que denunciava personagem poderoso no cenário
político nacional. O caso acabou se refletindo no próprio contexto político da época, com os
restauradores, dos quais fazia parte Jo Clemente d’Oliveira, exigindo abertamente a
punição de Carlos Miguel de Lima, enquanto os moderados o defendiam. Como
comentamos, a riqueza de detalhes promovida pelo O Homem de r traz também maior
risco, pois demonstra empenho do jornal em divulgar o crime, expondo os meios utilizados
pelo filho do Regente para escapar da prisão. A matéria acerca do caso se finda no número
três do periódico, e procurando em outros jornais, por volta do mês de outubro o assunto
parou de receber atenção e de ser noticiado pela Imprensa. Ao que tudo indica, Carlos
Miguel ficou em liberdade.
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Faces da História, Assis/SP, v. 10, n. 2, p. 168-190, jul./dez., 2023
A segunda matéria que destacamos como de importância na história d’O Homem de
Côr começou a ser noticiada já na 1ª página do número quatro do jornal:
[...] a prisão feita Sábado do corrente na pessoa do verdadeiro Americano, o Sr.
Mauricio Jozé de Lafuente, é a mais escandalosa, a mais arbitrária, e a mais
desumana que se tem visto nos nossos últimos tempos. As folhas do Governo têm
acintosamente insultado, e vilipendiado esse Patriota honrado, com epítetos de
pelintra, de caloteiro, de vadio, rusguento, anarquista, restaurador, etc etc. e
sem que nada disso tenham provado [...] e no dia em que apareceu o novo
Periódico moderado chamado A Restauração no qual é tratado o Sr. Lafuente
de bode, negro, e outros insultos próprios dos vingativos moderados (Homem de
Côr, 1833, p. 1).
Aparece com força o conflito “moderados x exaltados” no trecho citado. Novamente,
é em tom de denúncia que ocorre a chamada da notícia, porém ponto importante
presente no caso da prisão de Jozé de Lafuente que estava ausente no caso do assassinato
de Clemente: o preso é um homem negro. Dessa forma, nessa matéria se fazem atuantes as
duas frentes principais dO Homem de Côr: a denúncia da discriminação racial e das
injustiças cometidas contra a população negra brasileira, e a propagando política exaltada e
anti-moderada. Importante destacar que a própria palavra “negro” aparece no trecho como
ofensa, tendo caráter negativo.
A matéria continua na segunda página, no qual lê sobre a participação de Lafuente no
dia 6 de abril de 1831:
[...] porém estes serviços seriam tomados em consideração, se o Sr. Lafuente não
tivesse a pecha de ser mulato, único motivo que deu origem a sua prisão [...] é
desta sorte, ó Caros Compatriotas que os brasileiros, nossos irmãos, atropelam aos
homens de cor! (Homem de Côr, 1833, p. 2).
O redator sobe o tom da denúncia, e atribui diretamente a prisão à condição de
homem “mulato” de Lafuente. Como comenta Ana Flávia,
[...] ainda que, formal e intelectualmente, a utilização do termo ‘racismo’ date dos
anos 1920, bem antes disso, práticas racistas tornavam a vida do segmento
populacional negro brasileiro uma tarefa difícil com escravidão institucionalizada
ou não, no campo ou no meio urbano (Pinto, 2006, p. 43).
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largo debate na historiografia nacional acerca da legitimidade ou não do uso de
conceitos como raça e racismo antes do surgimento do racismo científico. Embora a noção
de raça, se utilizada nesse contexto, época dO Homem de Côr, possa soar anacrônica, como
apontam alguns pesquisadores
3
, negros e negras brasileiras sofriam injustiças e
discriminações por características físicas, culturais ou de origem. Dessa forma, aqui nos
servimos da ideia de “racialização”, como sugere a historiadora Wlamyra de Albuquerque:
Racialização traduz raça como noção em construção, à mercê das circunstâncias e
propósitos políticos diversos, que podem ser ou não antagônicos [...] raça soa como
ideia elaborada em circuitos científicos, racializar dizia respeito a concepções
postas em movimento do dia a dia das decisões administrativas, das páginas dos
jornais, da agenda abolicionista [...] (Albuquerque, 2011, p. 292).
Dessa forma, consideramos que antes da ideia de raça, havia o processo de
racialização, de utilizar e mobilizar noções como “negro”, “pardo”, “mulato” com objetivos
políticos, que no nosso entendimento é exatamente o que O Homem de Côr realiza em suas
matérias de denúncia, no caso, com objetivos progressistas, visando melhorar as condições
de vida da população afro-brasileira livre.
Nossa compreensão do termo “racismo” não está necessariamente atrelada ao que
se convencionou chamar de racismo científico, que propunha hierarquias naturais entre as
“raças”, inclusive delimitando capacidades físicas e intelectuais de acordo com estas.
Adotando o conceito de racialização para compreensão dos processos discriminatórios
raciais, como foi exposto acima, citamos novamente Wlamyra de Albuquerque:
O racismo [...] é a face nociva da racialização. Em diversas sociedades dispersas no
tempo e no espaço, racializa-se para referendar ou constituir hierarquias, para
assegurar poder e prestígio para determinados indivíduos e grupos (Albuquerque,
2011, p. 292).
Sobre a suposta “ausência” de racismo no Brasil p-século XIX, Ronaldo Vainfas diz
o seguinte:
3
No Brasil, podemos citar Larissa Viana, que reforça a inadequação em se utilizar o conceito de raça pré-teorias
raciais científicas. Na historiografia acerca da América Espanhola, citamos Jean-Pierre Zuñiga como membro da
mesma vertente (Raminelli, 2015, p. 210-211).
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Devo dizer, aliás, que a impertinência óbvia do conceito biológico de raça no Antigo
Regime não significa jamais admitir a ausência de racismo nos tempos coloniais,
nem deve inibir estudos e reflexões sobre o assunto. Basta relembrar os estudos de
Boxer, entre outros, que apontam para a existência de um conceito de raça ligado
ao sangue e à ascendência, conceito consagrado nos estatutos ibéricos de ‘limpeza
de sangue’, que só foram abolidos no Brasil em 1824 [...] (Vainfas, 1999, p. 12).
A faixa temporal estudada está inscrita justamente entre o fim do período colonial e
a publicação de A Origem das Espécies, de Charles Darwin, em 1859, que influenciou
bastante a linha de pensamento que Ronaldo Vainfas chama de “raciologia”, estudos das
ciências humanas que traziam a raça enquanto conceito biológico na base de suas reflexões.
Sobre o livro de Darwin, e sua enorme influência para as ciências humanas, Lilia Schwarcz
destaca que
se estabeleceram as bases para a afirmação de uma sorte de paradigma da
época em torno da noção de evolução. A novidade não estava na tese
anunciada, mas também na terminologia utilizada pelo cientista. Rapidamente
expressões como sobrevivência do mais apto’, ‘adaptação’, ‘luta pela
sobrevivência’, escapavam do terreno preciso da biologia e ganhavam espaço nas
demais disciplinas [...] tendo a tecnologia como índice comparativo, para os
evolucionistas a humanidade era representada como uma imensa pirâmide,
dividida em estágios distintos, que iam da selvageria para a barbárie, e desta para a
civilização. E, se a Europa aparecia destacada no topo, povos como os botocudos
no Brasil restavam na base, representando a infância da civilização (Schwarcz,
2018, p. 405).
Temos neste trabalho que as práticas racistas, que subjugavam pela força negros e
nativos brasileiros ganharam corpo teórico na segunda metade do Oitocentos, em que se
aliou biologia e história, ciência e natureza, enfatizando a superioridade da civilização e da
“raça” europeia em detrimento das demais. O surgimento de tal teoria, entretanto, não
pode ser considerada como marco e início das práticas e discriminações raciais no Brasil. A
nosso ver, ignorar as injustiças sofridas pela população negra no Brasil, antes do advento da
“raciologia”, justamente pelo fato de serem negros, é ignorar a história de milhares de
homens e mulheres, e ademais é linha de pensamento que se choca justamente com o
material trazido neste trabalho, que conta com jornais da época denunciando discriminações
e preconceitos sofridos pela população negra brasileira. Como defendeu Ronald Raminelli,
devemos pensar em um “racismo sem raça”, em discriminações que ocorriam antes do
racismo científico.
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Retornando mais detidamente à análise do jornal, ponto que merece atenção está no
uso da palavra “brasileiros” no texto. Os brasileiros são irmãos do grupo a que pertence o
redator, que se filia de modo implícito aos “homens de cor”, afirma-se como negro. Os
brasileiros do texto seriam, portanto, os brancos.
As denúncias do jornal se embasam nos dizeres da Constituição, estampados sempre
na primeira página de cada número. Dessa forma, há a consciência da existência de aspectos
jurídicos que estão sendo feridos constantemente, com o periódico enfocando na questão
da população negra. Portanto, havia um esboço de identidade negra na época, identidade
parda presente nos textos do jornal. Keila Grinberg destaca que
[...] ‘a experiência do racismo e a inserção no ambiente das revoluções liberais e
suas promessas de igualdade civil e liberdade’ teriam produzido homens
‘dilacerados por uma dupla consciência’, de homem pardo e de cidadão brasileiro
(Grinberg, 2018b, p. 289).
Cidadão e homem pardo: buscando se inserir na sociedade brasileira, cobrando
garantias previstas na Constituição, e, ao mesmo tempo, conscientes de sua condição
amplamente injustiçada. Era esse o caso de Paula Brito, mas também de Antônio Pereira
Rebouças, político e advogado, de Francisco Sabino, médico e jornalista, do próprio
Lafuente, e de outros homens negros brasileiros do Oitocentos.
Ainda no número quatro, o redator reitera sua condição de homem de cor,
comentando dessa vez a escassez de homens negros em cargos públicos:
[...] os moderados treparão sobre os vossos ombros em sete de Abril, e pondo aos
claros amigos no vimborio Político, desmancharão com os pés a escada por onde
treparão, e começarão desde então a excluírem entre si os homens de cor como
nós. Nas eleições tivemos o exemplo, não um representante das nossas cores,
dos Empregos Públicos, e de toda a parte nos excluirão, e vós ó escravos, que
mamando na teta de tais feras lhes estais dando força, desenganai-vos, pois os
moderados não fazem caso de vós por seres mulatos, deixai de uma vez esse
partido infame, e antibrasileiro que vos julga menos que seus escravos, e vinde de
novo alistar-vos nas nossas exaltadas fileiras (Homem de Côr, 1833, p. 4).
Ponto importante do trecho é a noção de coletivo trazida pelo redator, ou seja,
um senso de coletividade negra ou parda, ou de “homem de cor”, usando os termos da
época já existente, ou ao menos imaginado pelo redator na Corte da década de 1830. Falar
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em “movimento negro organizado” a partir do trecho citado é exagero; como ressalta Ana
Flávia, é mais preciso sugerir o jornal como “instrumento de luta antirracista” da época. O
mesmo senso de coletividade aparece na crítica aos negros apoiadores dos moderados, que
estariam prejudicando a si próprios. Finalizando, ainda se destaca o baixo ou inexistente
número de negros eleitos.
Denúncia que surge no fim do último número do jornal que guarda semelhanças
com a da prisão de Lafuente é a referente ao mulato” ndido de Assis, que trabalhava no
Arsenal de Guerra e não teria recebido aumento, como os colegas, por ser negro:
muito tempo que o Sr. Candido devia esperar pela sua demissão, pois em 1828
quando entrou para o Arsenal, fez-lhe crua guerra por ser mulato, a ponto do Snr.
Thomaz Jose de Aguilar Sandinabo deixou de ir ao Arsenal por espaço de DOIS
ANOS - vencendo o seu ordenado porque não queria estar em uma repartição
com MULATOS (Homem de Côr, 1833, p. 4).
Novamente, o jornal ênfase à questão racial, que seria motivação principal para
Cândido de Assis ser lesado em seu trabalho, não recebendo aumento salarial, e ainda
sofrendo humilhações de seu colega, citado pelo nome no texto.
Das três notícias que realçamos na análise, duas se referiam a casos marcados pela
discriminação racial, que era destacada pelas lentes d’O Homem de Côr. Deve-se ressaltar a
energia do redator em denunciar com veemência casos considerados injustos por ele, nem
sempre ligados à temática da discriminação racial. Como comentamos, seu projeto gráfico
não tinha divisão por seções, e a leitura de seus números pode por vezes parecer confusa,
pelas notícias por vezes não terem continuidade.
Considerações Finais
O Homem de Côr é dos primeiros jornais da história da imprensa do Brasil
oitocentista, por seu valor histórico, e sendo Paula Brito o redator ou não, é inegável que
suas histórias estão entrelaçadas. O periódico foi pioneiro na história da imprensa nacional
ao trazer recortes raciais para sua análise de notícias, o que empresta grande valor histórico
para suas páginas, especialmente ao trazer discussões e conteúdos até então inexplorados
no debate público da imprensa oitocentista. Nosso objetivo foi buscar recuperar
historicamente os debates nos quais o jornal se envolveu, buscando intervir na agenda
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pública da capital adotando a pauta então pioneira na imprensa imperial das denúncias
raciais, sendo exemplo de articulação política da população afro-brasileira. Embora
tenhamos buscado esgotar os debates nos quais o Homem de Côr se envolveu diretamente
o assassinato do redator do Brazil Afflicto, e a prisão de José Lafuente , um caminho
possível para ampliar o contexto no qual o Homem de Côr estava inserido envolveria cotejar
esses debates com os dos outros três jornais da imprensa identificada como “Imprensa
Negra”, que também surgiram no ano de 1833, além de, claro, empreender revisão na
sugestão original da historiadora Ana Flávia Magalhães Pinto, possivelmente alargando o
número de jornais.
Fontes
A Aurora Fluminense, Rio de Janeiro. Typographia do Diario de Rio de Janeiro, n. 815, 13 de
setembro de 1833;
A Aurora Fluminense, Rio de Janeiro. Typographia do Diario de Rio de Janeiro, n. 823, 2 de
outubro de 1833.
A Verdade, Rio de Janeiro, Typographia de Miranda e Carneiro, n. 220, 12 de setembro de
1833.
Correio Mercantil, Rio de Janeiro, Typographia de Gueffier, n. 00001, 2 de janeiro de 1833.
Correio Mercantil, Rio de Janeiro, Typographia de Gueffier, n. 00002, 3 de janeiro de 1833.
Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, Typograhia Imperial e Constitucional de Seignot-
Planchet, n. 00011, 5 de janeiro de 1833;
Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, Typograhia Imperial e Constitucional de Seignot-
Planchet, n. 00013, 8 de janeiro de 1833.
O Homem de Côr, Rio de Janeiro, Typographia Fluminense de Brito, n. 1, 14 de setembro de
1833.
O Homem de Côr, Rio de Janeiro, Typographia Fluminense de Brito, n. 2, 28 de setembro de
1833.
O Homem de Côr, Rio de Janeiro, Typographia Fluminense de Brito, n. 3, 16 de outubro de
1833.
O Homem de Côr, Rio de Janeiro, Typographia Fluminense de Brito, n. 4, 23 de outubro de
1833.
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Faces da História, Assis/SP, v. 10, n. 2, p. 168-190, jul./dez., 2023
O Homem de Côr, Rio de Janeiro, Typographia Fluminense de Brito, n. 5, 4 de novembro de
1833.
Referências
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