FACES DA HISTÓRIA, Assis-SP, v.6, nº1, p.120-140, jan.-jun., 2019
Memórias do Desastre Ambiental do Navio
Vicuña
(2004)
125
pescador se deslocava para a cidade, para exercer atividades não pesqueiras; a migração
sazonal pesqueira, na qual o pescador passava parte do ano fora de sua vila para exercer
uma atividade de pesca em outro lugar e, a migração de proximidade permanente,
quando o pescador apenas trocava de vila, mas continuava a exercer a pesca
(ANDRIGUETTO, 1999, p. 83-84). A migração é uma característica presente nas
trajetórias dos moradores que residem atualmente em Amparo. Em concordância com
Kraemer (1983) e Andriguetto (1999), observou-se o caso de famílias de tradição de
lavradores que se estabeleceram na localidade para exercer a pesca; famílias que se
estabeleceram em Amparo devido à proximidade com a cidade de Paranaguá, famílias
que combinavam as atividades de lavoura e pesca nas vilas de origem e que após migrar
para Amparo, continuaram a exercer as mesmas atividades.
No contexto atual, a pesca é a principal atividade econômica exercida pelos
moradores, no entanto, os entrevistados mencionam que no passado, também exerciam
a agricultura de subsistência. Nazira Rosa, ou Zica, apelido pelo qual é conhecida em
Amparo, nasceu no ano de 1941, em Taquanduva, localizada no município de
Guaraqueçaba. Por volta da década de 1960, ela se casou e mudou-se para Amparo. Ao
narrar suas lembranças de quando começou a pescar, lembra-se que começou a
trabalhar na roça desde muito pequena:
Quando começou a pescar?
Eu pesco desde que trabalhei na roça, trabalhamos até se aposentar, desde que
casei com ele. Me casei com 19 anos, tive família e tive filho depois de um ano de
casada. Depois, eu tive um menino meu mais velho que mora lá no Rocio.
Depois nós fomos pescando assim, quando eu não ia para a roça, eu ia pescar
com ele. Eu mais pescava do que trabalhava na roça. Na roça era gostoso de
trabalhar, mas eu ia sozinha né. Depois, uma comadre minha do Valadares veio
trabalhar comigo na roça, Ah meu Deus, aí sim, eu trabalhei muito, porque daí
nós fazia até farinha, porque nós tínhamos mandioca, fazia de saco de farinha.
Daí depois vendia farinha também, eu vendia para o pessoal que vinha buscar
em casa e levava para vender no negócio [...] Eu gostava de trabalhar na roça,
fazia tempo, desde menina. Lá no sítio que eu morava com minha mãe era assim,
morava num lugar próximo do Itaqui, morava lá no Taquanduva. Com mamãe eu
plantava batata, plantava feijão, plantava de tudo. [...] Aprendi de tudo na pesca,
camarão meu marido caçava comigo e eu também aprendi a caçar. Ele me
ensinava [...] peixe nós pescávamos tudo que é tipo de peixe, era gueri grande.
De tarrafa, quando eu ia com ele lá para um rio, eu ia com ele para lá pescar
meu Deus, trazia a tarrafa cheia assim de peixarada na canoa. Era assim nossa
pescaria, nos pescava também de linha, até um dia depois que ele morreu, eu
tinha uma canoa e fui, peguei a linha, um camarãozinho e fui pescar lá no rio, fui
lá guria, parece uma coisa. Fui devagarzinho, cheguei lá e sentei, peguei um
monte de peixinho, tudo peixinho grande (Nazira Rosa, entrevista, 30 jan.
2013)
3
.
3
Todos os depoimentos presentes neste artigo foram concedidos à autora deste trabalho durante as
pesquisas de monografia e dissertação. A realização das entrevistas teve como objetivo evidenciar as
lembranças de pescadores(as) que vivenciaram o desastre do Navio Vicuña. Todas as entrevistas foram
realizadas na localidade de Amparo, na cidade de Paranaguá, no estado do Paraná. Ver em: FIGUEIRA
(2014) e FIGUEIRA (2011).