Grande parte das raízes ideológicas do Exército Zapatista de Libertação Nacional
se encontra no projeto sociopolítico desenvolvido pelo revolucionário Emiliano Zapata
no início do século XX. O problema agrário constituiu-se, desta forma, em um dos eixos
centrais para os zapatistas da Revolução Mexicana
e para o EZLN, bem como a
marginalização sociopolítica enfrentada pela população camponesa e indígena do sul do
México e a construção de um país cujos governantes se atentassem para as minorias
sociais. Na Primeira Declaração da Selva Lacandona, em 1994, os insurgentes afirmaram
que
[...] somos produto de 500 anos de lutas, primeiro contra a escravidão, na
guerra de Independência contra a Espanha, encabeçada pelos insurgentes;
depois para evitar ser absorvidos pelo expansionismo norte-americano; a seguir
por promulgar nossa Constituição e expulsar o Império Francês do nosso solo;
depois a ditadura porfirista nos negou a aplicação justa das leis da Reforma e o
povo se rebelou, formando seus próprios líderes, seguindo Villa e Zapata,
homens pobres como nós, a quem foi negada uma preparação básica para
utilizar-nos como bucha de canhão e saquear as riquezas de nossa pátria, sem
importar-lhes que estejamos morrendo de fome e enfermidades curáveis, sem
importar-lhes que não tenhamos nada, absolutamente nada, nenhum teto digno,
nem terra, nem trabalho, nem saúde, nem alimentação, nem educação, sem ter
direito a eleger livre e democraticamente nossas autoridades, sem
independência dos estrangeiros, sem paz nem justiça para nós e nossos filhos.
(EZLN, 1994, tradução nossa)
.
Embora tanto os zapatistas liderados por Emiliano Zapata quanto os insurgentes
pertencentes ao EZLN tenham elaborado propostas de cunho sociopolítico a serem
colocadas em prática em âmbito nacional (reforma agrária, melhorias nas condições
socioeconômicas dos camponeses e indígenas mexicanos etc.), também desenvolveram
projetos autonômicos construídos em esfera regional. Segundo a historiadora Júlia Melo
Os zapatista elaboraram, em 1911, o Plano de Ayala. Além de não reconhecer o então presidente
Francisco Madero como líder do processo revolucionário e chefe de governo no México, “[...] era o
programa por excelência da revolta camponesa e da luta agrária no México. Estipulava que aldeias e
cidadãos que tivessem sido despojados de terras, montes e água recuperariam imediatamente a
propriedade desses bens, ‘mantendo a qualquer custo e de armas na mão, sua posse’. Definia como
obrigação dos usurpadores – e não dos camponeses ocupantes – a necessidade de demonstrar, perante os
tribunais, seus direitos de propriedade. Um terço das terras, montes e água seriam expropriados, já que na
ocasião estavam sendo usados somente por proprietários ociosos que monopolizavam a terra, e se
nacionalizaria a totalidade de bens ‘latifundiários, científicos ou caciques’ que se opusessem ao Plano de
Ayala.” (AGUILAR CAMÍN; MEYER, 2000, p. 44).
[No original: “somos producto de 500 años de luchas: primero contra la esclavitud, en la guerra de
Independencia contra España encabezada por los insurgentes, después por evitar ser absorbidos por el
expansionismo norteamericano, luego por promulgar nuestra Constitución y expulsar al Imperio Francés
de nuestro suelo, después la dictadura porfirista nos negó la aplicación justa de leyes de Reforma y el
pueblo se rebeló formando sus propios líderes, surgieron Villa y Zapata, hombres pobres como nosotros a
los que se nos ha negado la preparación más elemental para así poder utilizarnos como carne de cañón y
saquear las riquezas de nuestra patria sin importarles que estemos muriendo de hambre y enfermedades
curables, sin inmortales que no tengamos nada, absolutamente nada, ni un techo digno, ni tierra, ni trabajo,
ni salud, ni alimentación, ni educación, sin tener derecho a elegir libre y democráticamente a nuestras
autoridades, sin independencia de los extranjeros, sin paz ni justicia para nosotros y nuestros hijos.”].
(EZLN, 1994).