História como fonte artística: explicando arquivos, criando imagens; criando arquivos, explicando imagens
FACES DA HISTÓRIA, Assis-SP, v.3, nº2, p. 136-156, jul.-dez., 2016.
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três aquarelas e dois desenhos, Sidney Amaral monta um painel e convida o espectador
a pensar na história, em especial as representações históricas da narrativa hegemônica,
através de uma imagem outra.
Palavras-chave: Incômodo; Sidney Amaral; Abolição; Arte contemporânea; Antirracismo.
Abstract: This article aims to analyse Sidney Amaral’s artwork Incômodo, understanding
it as a work that performs between visual evidence and the construction of new histories.
In this work the artist made his own interpretation regarding the representation of slavery
abolition in Brazil, utilizing history, archives and memory as a source of artistic creation.
Incômodo is a composition of three watercolours and two sketches whereby Sidney
Amaral invites the viewer to think about history, especially its hegemonic narrative,
through a different lens.
Keywords: Incômodo; Sidney Amaral; Abolition; Contemporary art; Anti-racism.
“[...] no terreno das representações oficiais, vigorou sempre uma boa seleção:
seleção do que guardar, do que esquecer e do que é bom lembrar.”
Lilia Moritz Schwarcz
Para o curador Peter Weibel, o contemporâneo não se refere às recentes
transformações como um choque, nem como apenas confluência, mas um momento
em que se coloca em pauta um programa de reescrituras – política, social, cultural
e artística – que tem como objetivo estabelecer novas cartografias geopoéticas. Nas
palavras do autor,
Nossa perspectiva é que estamos experienciando uma época de um programa
de reescrita: reescrita da história da arte, reescrita da história política e
econômica em uma escala global. Traduções e transferências de uma cultura
para outra, em um mundo multilateral e multipolar, sem criar a hegemonia de
uma arte internacional, mas a reavaliação do local e do regional. Nós estamos
testemunhando a reentrada de partes esquecidas e inesperadas da geografia
e da história, nós experimentamos como os conceitos e eventos históricos são
reencenados. A arte contemporânea e o mundo contemporâneo são partes de
um programa global de reescrita (WEIBEL, 2013, p. 27).
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Em que pese forças reativas a ideia de um mundo multilateral e multipolar e uma
predominância de uma arte internacional alinhada historicamente com as heranças das
neovanguardas das décadas de 1960 e 1970, é verdade também que essas relações têm
sido questionadas e reavaliadas, principalmente em relação às articulações entre local
e regional. Há na arte contemporânea brasileira, de forma muita clara e reiterada, o
intento de reinterpretar e reescrever histórias através da reavaliação das representações
estabelecidas. Esse impulso é ainda mais perceptível nas poéticas da diáspora africana.
3. Tradução minha.