Chamada para Dossiê "Patrimônio Difíceis" (v.21, n.1/2025)

19-12-2024

Nas décadas recentes, os locais associados à rememoração de fatos de dor e eventos traumáticos se multiplicaram. Trata-se de um processo de memorialização dos espaços que remonta à interpretação das trincheiras e cemitérios da Primeira Guerra Mundial na Europa ou mesmo anteriormente, alcançando os conflitos mais recentes expressos em genocídios (o Shoah, Camboja, Ruanda). Progressivamente, esses lugares vêm sendo pontuados por monumentos, rememorações, museus, memoriais, museus-memoriais e, mais recentemente, nomeados como sítios de consciência. Não apenas os locais em si, mas toda a rede de rememoração — incluindo imagens, literatura correlacionada e testemunhos — passa a constituir um patrimônio vivo, atual e doloroso.

A realidade dos conflitos, que traz perdas humanas, físicas e econômicas, atinge diretamente o patrimônio material e imaterial dos grupos humanos, convidando à reflexão sobre o desligamento cultural, os acessórios e a devolução de bens apreendidos em processos de colonização, neocolonização e recolonização. A UNESCO tem trabalhado com conceitos como memória de conflitos, acontecimentos-limite e patrimônio conflituoso.

No continente americano, há uma ampla presença de sítios de consciência que remetem à experiência dos escravizados, aos genocídios das populações nativas e aos regimes ditatoriais, marcados pela violência do Estado contra os cidadãos. Além disso, a história latinoamericana recente deixou marcas em cidades e campos, em locais institucionalizados de segregação, como leprosários, manicômios, prisões, hospitais, locais de trabalho escravo ou segregação de populações em migração.

O dossiê visa, em primeiro lugar, reunir estudos que tratem de patrimônios difíceis, isto é, do reconhecimento de restos materiais de “um passado que é reconhecido como significativo no presente, mas que também é contestado e estranho para a reconciliação pública com uma identidade contemporânea positiva e autoafirmativa” (Sharon Macdonald, 2009). Acolhem-se estudos que permitam: reconhecer estruturas, objetos ou territórios relativos a situações controversas; refletir sobre o simbolismo destes monumentos ou memoriais; explicitar políticas de memória que os reconheçam e demandas jurídicas sobre a responsabilização dos envolvidos; compreender as posturas que os neguem ou movimentos que relembram  eventos coletivos traumáticos; e a difusão de locais que foram palco de regimes de exceção ou fatos traumáticos. Em segundo lugar, este dossiê também objetiva reunir artigos que estimulem, fundamentem e/ou consolidem propostas de ações de reconhecimento junto a órgãos e entidades de preservação relacionadas aos patrimônios difíceis.

Organizadores: Cristina Meneguello (Unicamp); Eduardo Romero de Oliveira  (Unesp)

Limite de dados: 30 de junho de 2025

Orientações para autores