Entre o Silêncio e a Lembrança:

A antiga Cadeia de Maceió

Autores

DOI:

https://doi.org/10.5016/pem.v21.e4077

Palavras-chave:

Cadeia Pública de Maceió, tombamento, Políticas de preservação, Memória.

Resumo

Este artigo analisa o reconhecimento da antiga Cadeia Pública de Maceió como patrimônio carcerário, no âmbito estadual. O estudo examina o processo de consolidação urbana do centro da cidade, no século XIX, período em que foram implantadas estruturas fundacionais, a exemplo da Igreja, do Pelourinho, da Casa de Câmara e da Cadeia. Inaugurada em 1817, a cadeia pública funcionou até o século XX, quando, devido à superlotação, os presos foram transferidos para o Presídio São Leonardo. Na década de 1970, o edifício foi demolido sob o argumento de que a cadeia representava um elemento espúrio, destoando do núcleo urbano do Centro – caracterizado por seu conjunto de edificações históricas, instituições públicas e intensa atividade comercial. Nesse contexto, o crescimento urbano e a demanda por novas vias motivaram intervenções viárias associadas à construção do Estádio Rei Pelé, priorizando a mobilidade urbana e a expansão da malha automobilística da cidade. Embora um pedido de tombamento tenha sido protocolado no IPHAN, em 1966, o imóvel não foi reconhecido como patrimônio digno de salvaguarda, sendo considerado um monumento de "triste memória". Por meio de fontes documentais, registros iconográficos e relatos orais de frequentadores da Praça da Independência, a pesquisa revela que o espaço ainda é identificado, socialmente, como “Praça da Cadeia”, demonstrando que, mesmo após sua destruição, a memória carcerária persiste de forma discreta entre os usuários do local. O artigo discute os limites das políticas patrimoniais tradicionais, ressaltando que a preservação de edifícios como cadeias não é uma ação neutra, mas sim, um instrumento de poder simbólico. O tombamento tem o potencial de legitimar certas memórias enquanto silencia outras, tornando-se um gesto político de enfrentamento do passado. O estudo propõe a revalorização desse legado histórico, destacando a importância da transmissão da memória às novas gerações.

Biografia do Autor

Karla Calheiros, Universidade Federal da Bahia

Mestrado Profissional em Conservação e Restauração de Monumentos e Núcleos Históricos da Universidade Federal da Bahia (MP-CECRE/UFBA) (2020) e especialização Lato-Sensu em Educação e Patrimônio Cultural (UAB/UNB) (2019), graduação em arquitetura e urbanismo pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, atuando, principalmente, nos seguintes temas: patrimônio cultural, com ênfase no patrimônio material e imaterial, memória, educação patrimonial, preservação do patrimônio cultural, levantamentos cadastrais, fotográficos e aéreos, além de publicações ludo-pedagógicas sobre educação patrimonial. Atuou no ano de 2017 a 2019 como conselheira titular no Conselho Municipal de Políticas Culturais de Maceió no segmento Patrimônio Material, Imaterial, arquivos e museus. Atualmente, está cursando a Pós graduação em Gestão Social do Patrimônio Cultural EAU/UFBA em parceria com o IPHAN (2025). 

Suzann Cordeiro, Universidade Federal de Alagoas

Professora Associada do Departamento de Arquitetura e Urbanismo e do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Professora Visitante do Programa de Pós-graduação da Faculdade de Direito, Medicina Forense e Criminologia, da Universidade de são Paulo (USP), Coordenadora do Núcleo de Pesquisas sobre Projetos Especiais (NUPPES/UFAL) e coordenadora da linha de pesquisa sobre espaços de encarceramento do Laboratório de Gestão Penitenciária da Universidade de Brasilia (LABGEPEN/UNB). Graduada e mestra em Arquitetura e Urbanismo (1998), Doutora em Psicologia pela UFPE (2008), Pós-doutorado em Criminologia pela Katholieke Universiteit Leuven, Bélgica (2016), estágio de capacitação Pós-doutoral em Design,Inovação e Tecnologia Pela C.E.S.A.R. School (2020), numa trajetória de pesquisa que aborda, de forma multi e interdisciplinar, o ambiente construído e, especificamente, a Arquitetura Prisional e socioeducativa. Foi Membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária - CNPCP (2011-2013), onde coordenou a elaboração das Diretrizes Básicas para Arquitetura Penal. (Resolução 9/2011) adotada como referência na Arquitetura Penal da América Latina. Colaboradora da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, para a elaboração das Diretrizes Básicas sobre Arquitetura socioeducativa do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE, 2005; 2017). Experiência na elaboração e desenvolvimento de projetos arquitetônicos e acompanhamento de obras de estabelecimentos prisionais, socioeducativos e de justiça, bem como elaboração e atuação em convênios com a Gestão Pública no Brasil e exterior (África, América Latina). Experiência na elaboração e desenvolvimento de projetos arquitetônicos e acompanhamento de obras de grande porte, bem como elaboração e atuação em convênios com a Gestão Pública. Consultora e Perita na área de Arquitetura Penal e Socioeducativa. Autora de vários projetos arquitetônicos e consultorias de Unidades Penais no Brasil e fora do país (África, América Latina). Autora de diversos livros sobre Arquitetura Penal/ Prisional e Socioeducativa.

Thalianne Leal, Técnica do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN)

Possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Alagoas (2007). Mestrado em Desenvolvimento Urbano pela Universidade Federal de Pernambuco (2011). Tem experiência na área de Conservação Urbana, com ênfase em Gestão do Patrimônio Urbano. Atualmente é servidora do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).

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Publicado

24-12-2025

Como Citar

Calheiros, K., Cordeiro, S., & Leal, T. (2025). Entre o Silêncio e a Lembrança: : A antiga Cadeia de Maceió . Patrimônio E Memória, 21(1), 1–34. https://doi.org/10.5016/pem.v21.e4077